Por Enio Rodrigues da Rosa.
Falando franco, eu não sei quem foi o sujeito que inventou essa história de que Deus não nos
dá a cruz para carregar com peso maior do que podemos suportar.
Ora, não foi porque Deus condenou seu próprio filho ao sacrifício no monte do carvalho,
depois de carregar a cruz onde seria esticado pelos braços e pernas até a morte, que eu
também preciso carregar a mesma cruz, como demonstração de fé incondicional.
Se Jesus Cristo aceitou este sacrifício imposto por seu pai que nada fez para salvá-lo, mesmo
vendo os sofrimentos e o clamor do filho: “pai, porque me abandonastes”, eu não estou a fim
de assumir o peso de uma cruz que não me pertence.
Dia desses, uma pessoa totalmente ignorante chegou para mim e disse que eu deveria aceitar
a cegueira de boa porque esta foi a cruz que Deus me deu para carregar. Pinoia, com este
papo jacaré.
Eu sou cego simplesmente porque uma doença atingiu meus olhos e os médicos não puderam
fazer nada, além do que a ciência possibilita na atualidade. Mais do que Deus, quem estava
realmente interessado na minha cura era eu e os médicos que mesmo me vendo sofrer, nada
puderam fazer.
Se alguém fica cego ou morre por qualquer motivo, Deus não esta nem aí, muito menos pode
ser culpado. Mandar para Deus broncas que são inteiramente nossas, não deixa de ser uma
maneira de compartilhar com um ser abstrato e invisível, os sofrimentos que não conseguimos
suportar sozinhos.
Dia desse, estava lá eu falando com minha irmã também cega, não por culpa e vontade de
Deus, por óbvio. Ela foi minha companheirinha de “penitência”, quando juntos lutavámos
desesperados em busca de uma cura, fazendo uma via sácrea, passando noites e noites dentro
de ônibus entre Cascavel e Curitiba.
Tinhámos a mesma doença e apesar dela ter se manifestado primeiro nos meus olhos, ela
acabou ficando cega antes. Hoje, além de cega, ela tem fibromialgia e foi diagnosticada pelo
seu psiquiatra como depressiva bipolar afetiva crônica – brincando,com um diagnóstico desses,
eu teria demitido o psiquiatra.
Mas, como “desgraça pouca é bobagem”, segundo uma expressão popular, recentemente ela
também foi “premiada” com uma doença rara e grave chamada de esclerose sistêmica.
É uma doença que dependendo da reação do organismo e se o tratamento não for feito com
medicamentos e cuidados terapêuticos adequados, pode produzir graves consequências nos
órgãos e nas extremidades do corpo.
De fato, no caso da minha irmã e das situações de tantas outras pessoas, eu espero que seja
verdadeira a tese de que Deus não dá para essas pessoas peso maior do que aquele que elas
conseguem suportar. É foda dizer isso, mas eu não consigo dizer nada além disso, para
confortar e alentar o coração e a alma de minha irmã, neste momento de dor.
Na ansia da morte, desesperado Cristo clamo a seu pai que nada fez, porque aquele era seu
destino, segundo a profecia. Nós, os simples mortais, quando os homens e mulheres de ciência
não nos dão as respostas e as explicações confortantes, mesmo os incrédulos, buscam em
entidades divinas um pouco de paz e conforto diante das dores que atingem seus corpos e
mentes.
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