
Correr aos domingos pela manhã tem a vantagem de encontrar ruas vazias, poucos carros e a cidade ainda adormecida. A desvantagem (sempre há uma) é abrir mão da noite de sábado — dormir cedo e evitar exageros nos drinks. Mas a compensação vem na perspectiva única de explorar a cidade de um jeito novo, de pertencer a ela enquanto todos dormem. Difícil é encontrar alguém disposto a acompanhar esse ritual. Quando se tem um parceiro, é uma dádiva; quando não, a solidão aguça a concentração.
Para mim, os primeiros 10 km são os piores: corpo frio, mente distante do plano traçado. Minha lógica pode parecer tosca para muitos — aproveito o momento, sem pressa. Alguns falam em “meditação em movimento”, em alcançar um flow. No meu caso, isso só acontece depois dos 20 km, quando o cansaço começa a bater e a resistência vira jogo mental.
Em distâncias maiores (varia conforme o preparo do corredor), a luta contra a ansiedade, o cansaço e a dor se intensifica. Em certos percursos e dias, surge outro desafio: a batalha contra a solidão e o tédio. É aí que entra a conversa interna, ferramenta imprescindível para seguir em frente. A mente humana é especialista em sabotagem: “Já corri o suficiente”, “O que estou fazendo aqui?”, “Por que não deixo para outro dia?”. Esses discursos mentais são obstáculos invisíveis. Contra-argumentar exige treinamento— é a vitória do prazer (evito em escrever disciplina) sobre o impulso.
Eis a essência do longão (como muitos chamam): um teste mental onde domamos o cérebro para servir aos nossos objetivos, não aos nossos medos. Celebrar pequenas conquistas — como completar a metade do percurso — é uma tática para reconquistar a mente.
No fim das contas, sem tesão, não há solução.
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