Logo depois que me formei, fui indicado para dar aulas de judô numa escola para deficientes visuais. Faço um recorte porque já contei essa história aqui. Isso foi na metade dos anos 1980, e junto com as aulas de judô, fui convidado para ministrar cursos e mais cursos pelo Brasil sobre a temática, deficientes visuais (DV). Eram poucos os especialistas na época, por isso me chamavam.
Uma das atividades mais atrativas que os professores gostavam- sim, os cursos atendiam a formação de professores – era quando eu propunha aos professores que vendassem os olhos para os deslocamentos externos ou, alguma atividade metodológica. Não só eu, era comum nas oficinas de formação observarmos estas atividades. A justificativa, dizíamos, era para “imaginar a realidade dos cegos.”
Foi assim por muitos anos, e isso não significa que existam atividades como estas com outros propósitos, entretanto, assim ensinávamos. Uma realidade tão efêmera, mas propositiva. Sabíamos que, quando tirávamos as vendas, o mundo era outro, voltava-se à realidade visual. Se por alguns minutos com os olhos fechados o mundo era “inseguro”, em seguida, voltava-se à segurança visual. Se pretende conhecer melhor a “outra” realidade, procure na internet “Como é ser um morcego?” (Thomas Nagel). Imperdível a leitura.
Toda essa introdução para falar sobre o livro “O último homem branco“(Mohsin Hamid), que mergulhei no feriado. Também uma leitura imperdível. Não trata do preconceito, vai além. Um homem branco que de um dia para outro, acorda “marrom” (brown – como escreve o autor). Simples (como vendar os olhos e…) uma cor de pele diferente do branco virou a vida de um indivíduo de cabeça para baixo.
Seria simples demais entender a alegoria extraordinária sobre a contemporaneidade, apenas utilizando do preconceito. Como nas minhas aulas sobre a DV, não basta uma técnica/preconceito para entender o humano, é preciso algo a mais.
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