É hora de decidir se crianças devem se apresentar ao novo mundo
“Os professores estão instruídos para, delicadamente, evitarem que as crianças se abracem ou fiquem muito próximas umas das outras. As turmas, que serão menores, não se encontrarão, e cada um trará o lanche de casa. Mas o que é preciso que todos tenham consciência é que tudo isso é para diminuir riscos e não para eliminá-los. Caso haja suspeita de contaminação, todos serão alertados.”
Setembro é o mês de a passarinhada tomar conta da escolinha da minha filha biscoita. É quando os jardins ficam mais bonitos e brincar de pega-pega é mais gostoso porque dá aquela quentura que, depois, é amainada com um belo banho de mangueira com água bailando para todo lado enquanto faz gargalhar a criançada.
Agora, é preciso decidir se ela —e tantos outros milhares de crianças— deve ir lá para fora, deve se apresentar a esse novo mundo adornado com máscaras e lambuzado em álcool em gel ou se permanece em casa, supostamente mais protegida, emocionalmente mais vulnerável pela mesmice das cores das paredes e dos vídeos da TV.7 7
É muito estranho, confuso e incômodo ter de pensar em “assumir riscos” quando se trata da saúde dos filhos e, em consequência, a da família toda e da própria comunidade escolar.
A gente é pai com a missão primeira de tentar proteger a cria até que ela seja relativamente apta a enfrentar o mundão, a decidir as próprias cores que pretende dar à vida.
Pelas “internets” e nas palavras de “especialistas”, não há dúvida de que voltar às salas de aula é urgente e “de boa”, ainda mais porque já podemos ir à praia, ao samba e ao boteco do Zé.
O problema dessa constatação é que, na escola, a responsabilidade pelo cuidado com a salubridade dos pequenos é repassada a outras mãos, que os olhos para tentar evitar a festa com o ranho dos amiguinhos não serão os dos pais, que, por horas, será o anjo da guarda quem assoprará no ouvido dos pequenos que precisam ter muito cuidado com esse danado de coronavírus
Em outros países, tudo também parece estar rolando bem na retomada das aulas, embora 4,3 milhões de infectados e 132 mil mortes sejam índices muito peculiares a nós, assim como serão os seus impactos, os seus desdobramentos e suas consequências.
Setembro é amarelo como alerta do valor da existência humana e do apoio que é preciso dar àqueles em sofrimento de viver. Setembro é verde pela ampliação da consciência de que podemos salvar pessoas doando órgãos. Setembro é azul pela visibilidade das pessoas surdas.
É certo, que, estando em casa, essa aquarela não pinte como deveria a formação e o coração de crianças, de adolescentes e de jovens. É na escola que matizes da diversidade, das demandas humanas, podem ser mais explorados, entendidos, pesquisados e discutidos.
Nessa encruzilhada multicolorida, vai ser necessário espírito de coletividade, mais do que nunca, pela segurança e pela integridade da gente.
Diferentemente de tempos “normais”, mandar o menino catarrento para a aula poderá implicar prejuízos sérios e até mesmo devastadores na realidade de dezenas, talvez centenas, de pessoas.
A escola é o melhor lugar em que imaginamos que nossos filhos possam estar quando não estão sob a guarda da própria família. Essa expectativa, neste momento tenso e de tantas cores a serem assimiladas, redescobertas e entendidas, só vai aumentar.
Professor, feliz primavera, e toda a sorte na mais nova missão: a de membro de honra da chamada “linha de frente” de combate à pandemia.
Jairo Marques – Jornalista, especialista em jornalismo social pela PUC-SP. É cadeirante desde a infância.
Deixe um comentário