
Sou desses que acredita que há heróis espalhados por vários cantos; muitos deles, perto de nós
Christopher Reeve, o eterno ator de Superman, morto em 2004, passou os últimos anos de sua vida exaltando a necessidade de compaixão, sensibilidade e apoio às diferenças humanas como salvação do mundo.
Neste momento em que parece ruir pelo planeta os conceitos de que somos melhores e mais fortes sendo plurais e sustentáveis, talvez apenas o poder do homem mais forte do universo possa nos salvar, mas não tão literalmente assim. Superpoderosos podem ser vários.
Internacionalmente famoso por ser um herói que livra a Terra das mais terríveis roubadas, Reeve terminou sua jornada de vida sob a mais desafiadora condição humana, que o acompanhou durante quase dez anos.
O homem que era capaz de fazer o mundo girar ao contrário, em um desses instantes que a existência bate forte na cara da gente, caiu de um cavalo e tornou-se tetraplégico, cadeirante, usando um respirador o tempo todo e com dependência absoluta dos outros. Se num dia erguia uma ponte nos braços, no outro não segurava uma pena com os dedos.
E foi em sua nova condição, absolutamente contrária à exaltação de força do homem de aço, que o Superman fez mais a diferença sendo inspiração e coragem para milhares de pessoas. Menos de um ano após a fatalidade, já apareceu, de cadeira de rodas, na cerimônia do Oscar falando em oportunidades de aprender com dores alheias.
Em um discurso para a “América”, em 1996, Reeve chamou à realidade, a meu ver, os tais valores que muitos defendem para manter tudo como está e para enxotar a diversidade de seus ainda ínfimos espaços.
“Ouvimos muito falar sobre algo chamado valores familiares. Eu lutei muito para entender o que isso significa. Acho que significa que todos somos uma só família e que todos temos valor. Se tivermos comprometidos com a ideia de família, temos de fazer algo a respeito. A América não permite que seus cidadãos se virem sozinhos.”

Cena do documentário Super/Man: A História de Christopher Reeve (2024)
Sou desses que acredita que há supermen espalhados por vários cantos. Muitos deles, perto de nós. Embora a força da kriptonita esteja renovada, em tons de laranja, os heróis são em maior número, sempre.
Lá em casa, minha mãe, que fará sua primeira festa de aniversário, aos 80 anos, só não tem a capa vermelha. Ela fez de sua vida energia para simplesmente fazer do filho caçula —esse “malacabado” colunista—, gente, após ter sido profundamente abalado pela paralisia infantil.
Só agora ela conseguiu lembrar de si –e ter fôlego— para celebrar a si mesma. Mamãe está radiante e eu aqui, meio século depois de tudo, batucando ideias de vidas plurais.
Em Santo Ângelo, no interior do RS, alunos de uma escola pública têm me mandado seus trabalhos de língua portuguesa, muito orgulhosos, em que debatem inclusão, diferenças de ser e pesquisam sobre esse escrevinhador. Gosto de pensar nessa professora “superman”.
Tem dado um medinho ver tantas manifestações de extremos, defensores de modelos que são puro suco da exclusão, ganhando terreno pelo planeta e angariando adeptos. Lex Luthor nunca desiste. Abracemos e reconheçamos nossos Supermen.
Por Jairo Marques (FSP 25/03/25)
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