Não à toa, ganhamos moeda na rua, somos subalternizados como consumidores, vistos como pobres coitados
É causa com pouquíssima glória labutar por dissociar condições físicas, sensoriais e intelectuais diversas de conceitos estigmatizantes como pessoas incapazes, imprestáveis, inábeis ou peso morto da sociedade.
A prevalência desses pensamentos absolutamente equivocados reflete no soterramento vivo de gente que poderia estar trabalhando, criando, produzindo e se abrindo possibilidades de conviver com a exclusão por todos os lados.
As estatísticas em torno de empregabilidade de pessoas com deficiência evidenciam o abismo onde são colocadas e a maneira como são tratadas.
O setor público, que deveria puxar a defesa incansável do conceito de que cada um é capaz dentro de sua realidade e com os instrumentos necessários para suas tarefas, é um vexame. Reportagem da Folha revelou que apenas 1,4% dos servidores federais tem algum tipo de deficiência.
Segundo o IBGE, de maneira geral, menos de 30% de gente que foi premiada na vida com diferenças físicas, sensoriais ou intelectuais estão no mercado de trabalho. O restante, algo como 13 milhões de viventes? O restante amarga a dependência extrema de familiares ou instituições ou vive em condições de miséria absoluta.
Não à toa, ganhamos moeda na rua mesmo sem pedir, somos subalternizados como consumidores, vistos por parte da humanidade como pobres coitados. E ainda tem o molho: temos de lidar com uma pasmaceira de ações diante do que nos é básico, acesso, dignidade e equidade. Somos invisíveis.
Mesmo para aqueles que estão empregados, o amargo da diferença desce queimando na goela. Levantamento recente da consultoria Diversitera, em 60 grandes e médias empresas brasileiras, com cerca de 90 mil pessoas, chegou a um percentual de 4,6% da força de trabalho vinda de pessoas com deficiência.
Marco Pellegrini primeiro usuário do emprego apoiado no Brasil, metodologia que busca oferecer os apoios necessários para que pessoas com de Gabriel CabralMais
E o assombro dos números só aumenta. Dos empregados com deficiência, só 18% consideram as instalações da firma totalmente acessíveis, 14%, num mesmo nível de escolaridade de pessoas típicas, ganham menos, 1,5% está em cargo de liderança e 35% afirmaram já ter sofrido agressão em algum nível, assédio ou preconceito por sua condição, o capacitismo, no ambiente de trabalho.
É interessante acompanhar a mobilização nacional pela mudança da escala de trabalho de 6×1 por um modelo que seria menos opressor, mais equilibrado e mais condizente com uma existência em que se quer tempo de qualidade, tempo livre. Nessa batalha, pessoas com deficiência estão levando de 7 x 0, desesperados em busca de uma prorrogação para que se possa entrar em campo e jogar.
Diante de tudo isso, muita gente foi convidada a jogar o jogo da dependência social para, pelo menos, comer grama. Milhares estão na dependência de um benefício que, agora, no meio da partida, anuncia-se a mudança de regras. Não bastará à pessoa com deficiência atestar a miséria, será preciso comprovar a humilhação humana contundente.
O povo que não vê, não escuta, não anda e não junta lé com cré da forma convencional tem em 3 de dezembro uma data reservada para seu “dia internacional”. Gritar ao mundo tem sido pouco para sermos ouvidos e compreendidos em nossos robustos anseios por mais humanidade. Oxalá nos ouçam em outros planetas.
Por Jairo Marques – FSP (03/12/24)
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