Com a mente focada, as pessoas ficam mais habilitadas para tomar decisões rápidas em jogos e a prática fica mais prazerosa
Jenny Marder THE NEW YORK TIMES
Era um dia de sol e vento no sudeste da Tasmânia, e Heather Larsen, atleta profissional de slackline, estava equilibrada sobre uma fita de náilon de 2,5 cm suspensa entre dois dos penhascos de beira-mar mais altos do hemisfério sul. Focas latiam e as ondas batiam nas pedras 300 metros abaixo dela.
Larsen estava presa à fita com um arreio e corda, mas as rajadas de vento e a altura a assustaram enquanto ela fez a travessia. Então ela se concentrou na respiração. Com os braços erguidos e joelhos levemente dobrados para absorver a vibração da fita, ela inspirava quando dava um passo e expirava no passo seguinte.
“Estou aqui”, ela pensava quando abaixava um pé. “Agora estou aqui.”
Larsen, 35 anos, utiliza esse tipo de respiração e mantra como forma de meditação para manter a concentração enquanto se equilibra sobre uma fita bamba. “Isso me ajuda a ficar presente naquele momento”, ela explicou, e impedir que se distraia com coisas como passos anteriores trêmulos ou alterações na tensão da fita mais para frente.
Já está comprovado que a meditação tem muitos benefícios, incluindo maior concentração, redução do estresse e eliminação de distrações mentais. Mas nem sempre é fácil encontrar tempo para meditar num dia agitado. Para alguns treinadores, médicos e atletas, porém, a meditação pode ser incorporada à rotina diária de exercícios, que é enriquecida.
Com a mente clara e focada, você está mais habilitado para tomar decisões rápidas num jogo de basquete ou de vôlei de praia. E especialistas dizem que a ênfase da meditação sobre a respiração e o corpo deslocam o foco do resultado –quer seja ganhar uma corrida, aumentar sua quilometragem ou perder peso—para o movimento em si, tornando a prática esportiva mais prazerosa.
Essa meditação frequentemente toma a forma do mindfulness, que Sara Lazar, professora adjunta na Harvard Medical School, descreveu como “prestar atenção ao momento presente de uma maneira aberta, curiosa e sem julgamento”.
Suas pesquisas mostram que oito semanas de prática de meditação de mindfulness, incluindo formas baseadas no movimento, como a ioga, geraram alterações estruturais benéficas no cérebro, especialmente em regiões cerebrais associadas ao estresse e à divagação mental. Para Lazar, incorporar o mindfulness à prática de exercício físico é simples e pode trazer recompensas inesperadas.
PARA COMEÇAR, RESPIRE
Antes de uma partida ou atividade esportiva que requer concentração, alguns minutos de respiração intencional podem preparar o praticante mentalmente, disse George Mumford, especialista em performance e autor de “The Mindful Athlete: Secrets to Pure Performance” (O atleta consciente: os segredos o desempenho puro, em português).
Ele liderou sessões regulares de meditação com os Chicago Bulls e Los Angeles Lakers. Durante a atividade, ele disse, a respiração profunda pode acalmar o que ele descreve como “o cérebro de macaco” –a mente cheia de emoções e pensamentos.
“Você está agitado, está disperso. Você está com a cabeça em mil coisas, então não está presente em lugar algum”, ele explicou.
A dra. Chiti Parikh dirige o Programa de Saúde e Bem-Estar Integrativos no NewYork-Presbyterian Hospital. Ela ensina seus pacientes a respirar profundamente de uma maneira que envolve o diafragma, o maior músculo respiratório do corpo, que separa a cavidade peitoral do abdome.
Estudos indicam que a respiração profunda pode ativar funções corporais associadas à calma e ao relaxamento, aquietando as respostas de estresse. De acordo com Parikh, quando estão fazendo atividade física as pessoas tendem a respirar superficialmente, em vez de respirar com o diafragma, enchendo os pulmões mais completamente.
Para treinar-se a respirar dessa maneira, ela recomendou, deite-se de costas, relaxe os músculos e ponha uma mão sobre o peito e outra sobre o abdome. Faça respirações longas e pausadas, inspirando e expirando pelo nariz, e observe como suas mãos se movem. Inspire em quatro segundos e expire em seis. Vá alongando as expirações pouco a pouco. Observe como seu peito se mexe quando você respira superficialmente, mas quando faz respirações profundas, sua barriga também se move.
Quando você souber respirar profundamente, pode incorporar essa respiração a qualquer atividade: natação, mergulho ou limpar a neve da calçada.
FOCO SOBRE O CORPO
Enfocar as sensações de seu corpo enquanto ele se movimenta –por exemplo, visualizar as partes de seu corpo e pensar sobre os grupos de músculos envolvidos num movimento— também é algo que pode acalmar uma mente distraída, disse Kalpanatit Broderick, que administra um estúdio de fitness em Seattle que combina treinamento de força e cardiovascular com meditação de mindfulness.
“Se eu presto atenção ao meu corpo quando estou fazendo uma flexão, posso sentir meus ombros, meu peito, meus tríceps, meus quadríceps”, disse Broderick, que foi no passado um fundista que figurou no ranking nacional americano. Ou, durante uma corrida, ele recomendou, pense em como seus braços estão balançando, se seus ombros estão relaxados, se você está tocando o chão primeiro com os calcanhares ou os dedos dos pés.
Isso vai obrigá-lo a prestar atenção ao movimento, em vez de ficar com a cabeça atenta para o resultado, ele explicou. “O paradigma atual de fitness é baseado nos resultados”, ele disse. Mas exercitar-se com meditação acalma a mente, conecta você com seu corpo”, e “então podemos sentir prazer no que está em volta”.
Lazar sugeriu o uso de um aplicativo de meditação. Alguns apps desse tipo têm meditações criadas especificamente para caminhadas ou outros tipos de movimento. Muitos são gratuitos, mas outros são pagos mensalmente.
DEFINA UMA INTENÇÃO
Dois anos atrás, para combater o estresse que enfrentava trabalhando em um emprego agitado e cuidando de seu filho sozinha durante a pandemia, Imani Cheers começou a seguir um ritual diário de corrida, caminhada, ioga e ciclismo, todos com meditação.
Uma parte fundamental de sua meditação consiste em definir uma intenção para cada dia, que ela repete para si mesma em voz alta enquanto se exercita. Por exemplo: “não espere bons resultados enquanto repete maus hábitos” ou “terminar esta meia maratona sem me machucar”.
Sua rotina foi mais afetada do que apenas a forma como fazia sua prática esportiva, disse Cheers, que é pró-reitora de ensino de graduação na George Washington University. “Estou com 41 anos e estou mais saudável, mais forte e feliz que em qualquer outro momento da vida. E quem é que pode dizer isso depois de uma pandemia?”
A META: ENCONTRAR O ‘FLOW’
Incluir a meditação em seu movimento pode ter outro benefício: pode levá-lo a alcançar o estado de “flow”.
Em seu livro “Flow: A Psicologia do Alto desempenho e da Felicidade”, o psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi, o primeiro a cunhar o termo “flow”, o descreve como “um estado em que a pessoa está tão envolvida numa atividade que nada mais parece ter importância”.
Qualquer pessoa que se exercita ou pratica esportes, seja como profissional ou amador, provavelmente já vivenciou alguma versão do estado de flow. George Mumford disse que na quadra de basquete, o estado de flow faz a cesta “crescer” e o tempo desacelerar.
A definição de flow dada por Csikszentmihalyi se parece muito com os benefícios obtidos com o movimento meditativo: clareza interior, foco intenso e um senso de serenidade. E, embora meditar antes ou durante o exercício não seja uma garantia de flow, pode criar as condições para se alcançar esse estado. “Você não está tentando fazer as coisas acontecer –está deixando que aconteçam”, disse Mumford.
Heather Larsen, a praticante de slackline, concorda. Ela é conhecida sobretudo por suas manobras radicais, como espacate, parada de mão ou dependurar-se de cabeça para baixo dos tornozelos, tudo realizado sobre uma fita estendida sobre o vazio em altitude aparentemente impossível. Uma de suas slacklines favoritas perto de sua casa, no sul do Utah, se estende sobre um cânyon, com pedras e árvores muito abaixo.
Ali Larsen consegue acessar o estado de flow facilmente, porque com a meditação ela aprendeu a afastar as distrações, o ego e o foco sobre o resultado. E essa é a meta do movimento meditativo, ela disse: “O esforço desaparece, e o movimento simplesmente é. A sensação é maravilhosa, e parece fácil.”
Tradução de Clara Allain
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