“O que eu faço com o que fizeram de mim”, Sartre da esse empurram para um outro começo, o mesmo começo quando “Urano se desgruda de Gaia” , e aí entendemos tempo e espaço. Deste recomeço termino a série sobre meus sonhos de viagem ou, se preferir, “em busca de um amor”. Cheguei em Rondônia nos anos 80 para mudar o Brasil, troquei o melhor emprego que qualquer recém formado em educação física poderia ter, – era treinador de natação do maior colégio estadual do Paraná. Em Rondônia(Rondonha, como era chamada) me inscrevi para trabalhar na zona rural, 25 km de Porto Velho, a capital. Com toda “experiência” de 21 anos, fui direcionado para lecionar matemática, português, ciências e… educação física. A diretora das escolas e eu éramos formados os demais professores eram ainda estudantes do hoje EJA. Foi com esse envolvimento que descubro que meus estudos e propostas pouco serviam ali, mas a atração pelo público que estava na minha frente – eram alunos de diversas idades- era o suficiente para a minha transformação. Todos os dias nessas escolas – eram duas escolas, muito próximas uma da outra, atrás passava o Rio madeira(conta a lenda que, quem bebe água do rio Madeira, sempre volta) – percebia que um sentimento de carinho e admiração tomava conta de mim, – isso era amor? Que amor era este? “Eros, o amor possessivo e ciumento que toma e consome? Philia, o amor de amizade que se regozija com a simples existência do outro? Ou de agape, o amor que dá gratuitamente sem nada a esperar em troca e que pode chegar a englobar o inimigo? Ou dos 3 ao mesmo tempo?” Retomando, quando tomei posse, lembrei e fui buscar inspiração em Paulo Freire, precisava de alguém para me ajudar -havia lido no último ano de faculdade, educação bancária; educação como prática de liberdade; e a pedagogia da autonomia – bom, acreditava que era a momento de aplicar o método. Uma experiência nova e desafiadora. Não que fosse meu primeiro emprego, mas o primeiro fora das minhas raizes profundas. Me sentia um jabuti, mas com esperanças de cumprir o objetivo de mudanças. Começar, então, por onde?
. As narrativas dos alunos eram o método das minhas aulas, eram histórias de vida incríveis, honestas e sustentáveis. Cercado das narrativas, construiria o conteúdo e aprendia com eles. Aprendi o que é amor com os alunos/ professores, olhávamos nos olhos para saber se às partes estavam entregues, se existia o “encontro verdadeiro”. Dentro de minha limitação “revolucionária e acadêmica”, ensinar o básico da escrita e leitura já era o suficiente. Mas aconteceu muito mais que isso, éramos felizes com os encontros. Com a ludoterapia, justifiquei as disciplinas de Geografia e Ciências; o aprendizado da matemática era reforçado com as gincanas; português, com as receitas de culinária da região e; sonhar, foi através da música. Descobrimos juntos os próprios sons do corpo. Pescar, aprendi com eles, mas ensinei- os a preservar à natureza. A troca foi honesta e real. Aprendíamos o que era prático para aquele momento, com as próprias realidades das comunidades.
Voltei passado décadas por onde aprendi o que é amor, quando entendi e descortinei a minha insignificância. Deparar-se com as diferenças nos aproximam do existencial. A vida relacional rompe as barreiras atitudinais e desvendam um mundo mais humano. Isso nem sempre é fácil descobrir, é tão raro como o Nirvana. Por isso a necessidade das “aventuras “ da vida.
Rever como estão às pessoas que um dia me ajudaram a explorar o mundo com a dimensão do real, do encontro, da natureza, foi pacificador da alma. Sem medo de errar, foi a melhor escola que já passei e é por isso que voltei para Rondônia. O chamado “qualquer dia” foi essa semana.
Retorno para Curitiba de avião, reenergizado, feliz pelo que vi e vivi.Vida que segue
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