Lógico que os negacionistas encontraram uma desculpa para não tomar vacina contra o Covid. O autismo. Se uma epidemia de autismo estava em marcha no início do século XXI, era lógico que alguma coisa a havia causado*. Sim, uma epidemia. Em poucos anos o número de diagnóstico do autismo (TEA) cresceu assustadoramente. No inverno de 1998, em Londres, o epicentro do fenômeno, apontou-se um suspeito: uma vacina.
A suspeita recaía na agulha de uma vacina. Se nos primeiros casos da descoberta do autismo, a mãe era a culpada – mãe geladeira – agora era a vez da vacina.
O ano era 1998, e lembro muito bem como isso impactou as minhas discussões (na UNESPAR) sobre os casos do hoje TEA (Transtorno do Espectro Autista). Tudo começou no Hospital Royal Free, em Londres, quando um de seus médicos (gastroenterologista) Andrew Wakefield escreveu um artigo, com mais doze coautores e publicaram na Revista Lancet. Uma das Revistas mais respeitadas sobre medicina.
Em resumo: “O artigo descrevia doze crianças por ele examinadas nos cerca de dois anos anteriores e que apresentavam comportamentos autistas acompanhados de inflamação intestinal grave. A combinação encontrada nas crianças – problemas intestinais, autismo e vírus do sarampo – compunha a base de uma síndrome única.”
E aí vem o motivo principal porque muitas pessoas se recusam a se vacinar contra o Covid ou, pior, porque muitas gestantes negavam a vacina. O vínculo causal: A vacina conhecida como SRC (aqui no Brasil). Depois de ministradas em algumas crianças, as mesmas começaram a apresentar problemas estomacais e os comportamentos autistas. A briga política sobre o epicentro torna-se mundialmente conhecida.
Quando o enredo desloca-se para o EUA, a mudança do culpado é o mercúrio das vacinas. Essas brigas políticas-científicas-familiares, fica mais evidente quando David Kirbypublica Evidence of Harm(Indício de dano), um “relato em estilo subliterário da campanha das mães do mercúrio.” O autor narra a briga dos pais ativistas na ambição de provar que foi o mercúrio das vacinas o causador do mundo infernal e perdido do autismo.
Como meu espaço é reduzido – nada impede de continuar este assunto em outro momento – pode-se concluir então que autismo não é causado por nenhuma vacina. A ciência entra em cena e as discussões tornam-se reais quando o senado americano, “aprova a Lei de Combate ao Autismo, isso em 2006, autorizando uma despesa de 1 bilhão de dólares em cinco anos para satisfazer as necessidades das pessoas com autismo.” Esse impulso financeiro, mostrou que as verdadeiras causas do autismo, ainda estão longe de ser respondidas. Apesar das interrogações, da raiva e medo de não conhecer a verdadeira causa, a aceitação deste processo torna-se inviolável enquanto a ciência não bate o martelo. Um aprendizado para toda a sociedade civilizada e coerente.
Isso prova que, mesmo um artigo científico não pode ser definitivo num assunto tão complexo como o autismo ou mesmo o Covid.
*Livro Outra Sintonia, John Donvan & Caren Zucker, Companhia das Letras, 2017
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